Estamos no Ano Jubilar da Misericórdia e somos convidados a fazer uma
experiência pessoal e profunda do Amor de Deus que se manifesta em no
encontro com Jesus, o rosto da Misericórdia do Pai.
Do coração do Papa Francisco nos veio este Ano Jubilar Extraordinário
– Ano da Misericórdia. Ele mesmo sempre de novo nos tem chamado para
esta graça especial.
Em uma sua entrevista ao jornalista Andrea Tornielli, que se tornou um livro: O nome de Deus é misericórdia,
mais uma vez o Papa dá suas respostas simples e diretas. A mim me
chamou a atenção o final do livro, as últimas perguntas da entrevista em
que resume sua compreensão do fundamental da vivência deste Ano
Especial. Creio que será ouvi-lo diretamente.
Pergunta o jornalista: Quais as experiências mais importantes que uma pessoa de fé deveria viver no Ano Santo da Misericórdia?
E o Papa Francisco responde: “Abrir-se à misericórdia de Deus,
abrir-se a si mesmo e ao seu coração, permitir que Jesus venha ao seu
encontro, aproximando-se com confiança do confessionário. E procurar ser
misericordioso com os outros.”
E feita a experiência de receber o Amor Misericordioso de Deus em si
mesmo, transbordar como consequência, em gestos concretos, a
misericórdia para com todas as pessoas, especialmente as que mais
necessitam. E quem não necessita?!
Pergunta ainda o jornalista: As famosas “obras de misericórdia” da tradição cristã são ainda válidas para este terceiro milênio ou terão de ser repensadas?
Ainda o Papa Francisco responde: “São atuais, são válidas. Talvez
em alguns casos se possa “traduzir” melhor, mas continuam a ser a base
do nosso exame de consciência. Elas nos ajudam a nos abrir à
misericórdia de Deus, a pedir a graça de entender que sem misericórdia a
pessoa não pode fazer nada, e que “o mundo não existiria”, como dizia a
senhora idosa que encontrei em 1992.
Observemos acima de tudo as sete obras de
misericórdia corporal: dar de comer aos famintos; dar de beber aos
sedentos; vestir quem está nu; acolher os peregrinos; visitar os
doentes; visitar os prisioneiros; enterrar os mortos. Parece-me que não
há muito o que explicar. E se olharmos para a nossa situação, para as
nossas sociedades, parece que não faltam circunstâncias e oportunidades à
nossa volta. Perante o sem-teto que dorme debaixo da nossa janela, o
pobre que não tem o que comer, a família dos nossos vizinhos que não tem
o suficiente para chegar ao fim do mês devido à crise, por o marido
perdeu o emprego, que devemos fazer? Perante os imigrantes que
sobrevivem à travessia e desembarcam nas nossas costas, como devemos nos
comportar? Perante os idosos solitários, abandonados, que não tem mais
ninguém, que devemos fazer?
Gratuitamente recebemos, gratuitamente damos. Somos
chamados a servir Jesus crucificado em cada pessoa marginalizada. A
tocar a carne de Cristo em quem é excluído, tem fome, tem sede, está nu,
preso, doente, desempregado, perseguido ou refugiado. Ali encontramos o
nosso Deus, ali tocamos o Senhor. Foi o próprio Jesus quem o disse,
explicando qual será o critério pelo qual todos seremos julgados: todas
as vezes que fizermos isso ao menor dos nossos irmãos, teremos feito a
Ele (Evangelho de Mateus, 25, 31-46).
Às obras de misericórdia corporal seguem as de
misericórdia espiritual: aconselhar os indecisos; ensinar os que não
sabem; advertir pecadores; consolar os aflitos; perdoar as ofensas;
suportar pacientemente as pessoas difíceis; rezar pelos vivos e pelos
mortos. Pensemos nas primeiras quatro obras de misericórdia espiritual:
no fundo não tem a ver com aquilo que definimos como “o apostolado do
ouvido”? Aproximar-se, saber escutar, aconselhar, ensinar acima de tudo
com o nosso testemunho.
Da acolhida ao marginalizado que está ferido no corpo
e da acolhida ao pecador que está ferido na alma, depende a nossa
credibilidade como cristãos. Recordemos sempre as palavras de São João
da Cruz: “No anoitecer da vida, seremos julgados sobre o amor”.
E Amor é o que Deus é (cf. 1 Jo 4,8). Deus é Amor – e este Amor é Misericórdia para conosco e com todos.
Arcebispo Metropolitano de Fortaleza
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