Dom Alberto Taveira Corrêa
Arcebispo de Belém do Pará
Jesus, que veio para servir e não para
ser servido (Cf. Mc 10, 45), formou seus discípulos de todos os tempos
na escola do serviço mútuo. Desde sempre, mesmo com o mistério do
pecado, que provoca escândalos, divisão e todos os seus frutos (Cf. Lc
17, 1-4), o Senhor se faz presente, proclamando a misericórdia,
espalhando o perdão, edificando a reconciliação e a paz. Até hoje, o
serviço prestado pela Igreja, quando vivido com autenticidade, tem o
rosto da caridade.
Só que os discípulos, desde tempos idos,
devem ser continuamente formados e corrigidos. O Evangelho de São Lucas
(Cf. Lc 17, 1-10) reflete os caminhos para solucionar problemas vividos
pelas primeiras gerações de cristãos, além de anunciar a Palavra de
Jesus. Dali colhemos ensinamentos para nossa vida pessoal e nas
Comunidades cristãs. Começa dos pequenos, os mais simples, a serem
respeitados, que não podem ser escandalizados e devem estar no coração
da comunidade cristã (Cf. Lc 17, 1-2). Com eles, ganham destaque (Cf. Lc
17, 3-4) os mais fracos e pecadores, com os quais, "sete vezes", isto
é, sempre, há que se perdoar!
Certamente a proposta de Jesus causa até
hoje reações, parecendo impossível vivê-la integralmente. Só com a fé e
a confiança total em Deus! (Cf. Lc 17, 5-6). Com a fé, podemos
tornar-nos capazes de destruir a montanha de preconceitos existentes no
relacionamento entre as pessoas, para jogá-la ao mar e tornar-nos
livres e irmãos de verdade. Assim se pode compreender o que o Senhor
pede, quando exige que os cristãos se sintam quais servos inúteis!
Trata-se de servir aos outros sem buscar retribuição, apoio ou elogio.
Mais adiante, a gratidão e a simplicidade, que não vão atrás da
propaganda enganosa (Cf. Lc 17, 11-21), completam este pequeno manual de
vida cristã em Comunidade! E ele pode ampliar seu alcance para a
sociedade!
Justamente neste final de semana, o
Brasil inteiro vai às urnas, para eleger as pessoas que deverão estar à
frente dos poderes executivo e legislativo dos municípios de nosso país,
chamados a servir e não ser servidos! Podemos imaginar a dificuldade
para qualquer candidato acolher a provocante proposta de Jesus: "Assim
também vós: quando tiverdes feito tudo o que vos mandaram, dizei: 'Somos
simples servos; fizemos o que devíamos fazer'" (Lc 17, 10).
Embora não tenha nenhum partido político
nem faça campanha partidária, a Igreja pode e deve orientar os seus
fiéis sobre a importância de seu voto consciente e correto. “A Igreja
não pode nem deve tomar nas suas próprias mãos a batalha política, não
pode nem deve se colocar no lugar do Estado. Mas também não pode nem
deve ficar à margem na luta pela justiça. Deve inserir-se nela pela via
da argumentação racional e deve despertar as forças espirituais, sem as
quais a justiça... não poderá firmar-se nem prosperar” (Bento XVI, Deus
Caritas Est, n. 28).
Na Doutrina Social da Igreja, "política"
é "uma prudente solicitude pelo bem comum" (João Paulo II, Laborem
exercens, 20). "Os fiéis leigos não podem de maneira nenhuma abdicar de
participar na 'política', ou seja, na multíplice e variada ação
econômica, social, legislativa, administrativa e cultural, destinada a
promover de forma orgânica e institucional o bem comum” (João Paulo II,
Christifideles laici, 42).
Infelizmente, a corrupção eleitoral
ainda é um problema enraizado na mentalidade do nosso povo. Muitos acham
natural a troca do voto por algum favor do candidato. É preciso
instalar uma nova consciência política e mudar a situação com o nosso
voto. Voto não se vende. "Voto não tem preço, tem consequências". Não se
deve votar apenas levados pela propaganda, pela maioria, pelo interesse
financeiro pessoal ou por pressão. Cada um é responsável pelo seu voto e
suas consequências. O voto para escolher o Prefeito e Vereadores é
importante. Depende de cada um de nós que o município seja governado por
pessoas que desejam o bem de todos. Quem não cuida honestamente de seus
negócios pessoais ou empresas não tem condições de representar o povo
na Prefeitura nem na Câmara de Vereadores. Cabe-nos escolher candidatos
que não trocam seu voto por tijolos, bolsas de alimentos, remédios,
promessas ilusórias para melhorar seu bairro, candidatos que respeitam e
valorizam a família, candidatos com ficha limpa, que não aumentem seus
bens pela corrupção.
É necessário campear no meio do imenso
leque dos homens e mulheres que se apresentam como candidatos, para ver
quem valoriza a educação das crianças, adolescentes e jovens, o ensino
religioso nas escolas e o atendimento melhor à saúde, quem respeita a
vida em todas as idades e é contra o aborto. Especialmente em nosso
ambiente, verificar quem respeita o equilíbrio da natureza - florestas,
rios-, promove o saneamento básico e a construção de moradia em lugares
sem risco. Em quem apresenta projetos práticos por transporte digno para
a população. Em quem se compromete com uma organização eficaz para a
segurança e paz da sociedade (Cf. Dom Fernando Rifan, Eleições 2012).
Um dos princípios basilares do
Ensinamento Social da Igreja, a busca do Bem Comum, pode ser um critério
adequado para o exercício da cidadania nas eleições municipais. E este é
uma das fragilidades da prática política em nosso país. Grupos
ideológicos ou setoriais visam em primeiro lugar seus interesses
corporativos, ao invés de compreender a política, que, em si é uma alta
forma de caridade, como o caminho para se buscar o bem de todos,
considerando como privilegiados os mais frágeis da sociedade, os pobres e
excluídos, que clamam por justiça!
Enfim, podemos olhar para Jesus, o Filho
de Deus, condenado à morte por um conluio político-religioso no tempo
da ocupação romana na Palestina. Por causa de sua confiança no Pai,
acolheu a todos como irmãos, interpelou o sistema político vigente, que
mantinha marginalizadas tantas pessoas. Conduzido à morte no Calvário,
diante de seus algozes, do alto do trono da Cruz, aquele que veio para
servir e não para ser servido, é capaz de dizer "Pai, perdoa-lhes! Eles
não sabem o que fazem!" (Lc 23, 34). É ousadia, mas o perdão, a
reconciliação, a capacidade para olhar os adversários na política e na
sociedade como irmãos, tudo isso pode ser o caminho para o dia seguinte
às eleições!