Dom Murilo S.R. Krieger
Arcebispo de São Salvador da Bahia (BA) e Primaz do Brasil
As últimas décadas viram renascer na
Igreja a realização periódica de sínodos – assembleias de bispos de todo
o mundo, presididas pelo papa. Os bispos se reúnem para tratar de
assuntos ou problemas concernentes à Igreja universal. Das propostas de
um sínodo nasce uma "exortação apostólica", que passa a iluminar a ação
pastoral de dioceses e fieis.
Em outubro do ano passado, o Papa
Francisco convocou uma Assembleia Geral Extraordinária do Sínodo dos
Bispos, com o tema: "Os desafios pastorais da família, no contexto da
evangelização". Ela será realizada em duas etapas: a primeira, que
começa hoje, no Vaticano, avaliará e aprofundará os dados e as sugestões
recebidas do mundo todo, em relação ao tema proposto. A segunda, em
2015, com um maior número de participantes, refletirá sobre as temáticas
então abordadas, para elaborar uma lista de proposições.
Pelas colaborações e propostas que já
chegaram ao Vaticano, de todas as partes do mundo, ficaram evidentes
tanto a importância da família como as dificuldades que ela enfrenta,
especialmente por causa do contraste entre os valores propostos pela
Igreja a respeito do matrimônio e da família, e a situação social e
cultural diversificada em todo o planeta. Nossa sociedade é dominada por
uma cultura hedonista, relativista, materialista e individualista.
Espalham-se concepções que levam a uma excessiva liberalização dos
costumes e a uma fragilidade das relações interpessoais. É comum a
rejeição de escolhas definitivas, passando a dominar a cultura do
descarte e do provisório.
Recentemente, o Papa Francisco lembrou
uma observação do apóstolo Paulo aos cristãos de Roma: "Não vos
conformeis com este mundo, mas deixai-vos transformar, renovando o vosso
modo de pensar, para poder discernir a vontade de Deus" (Rm 12,2).
Vivemos no mundo totalmente inseridos na realidade social e cultural do
nosso tempo, e com razão; mas isso traz o risco de que nos tornemos
"mundanos", o risco de que "o sal perca o sabor", como diria Jesus, ou
seja, perca a novidade que lhe vem do Senhor e do Espírito Santo. Em vez
disso, deveria ser o contrário: quando nos cristãos permanece viva a
força do Evangelho, essa força pode transformar os critérios de juízo,
os valores determinantes, os pontos de interesse, as linhas de
pensamento, as fontes inspiradoras e os modelos de vida" (31.08.14).
O questionário em preparação ao Sínodo
procurou colher elementos para a revitalização da família. Das sugestões
que constam no "instrumento de trabalho", que servirá de base para os
debates, destaco as seguintes: buscar novas formas de transmitir os
ensinamentos da Igreja sobre o matrimônio e a família; renovar nossa
linguagem sobre a família, particularmente sobre o conceito de "lei
natural", para tornar os valores do Evangelho compreensíveis aos nossos
contemporâneos; promover uma pastoral capaz de estimular a participação
da família na sociedade; insistir no envolvimento do pai e da mãe, tanto
na educação dos filhos como nos trabalhos domésticos; ressaltar a
importância da oração em família, a leitura comum da Escritura, a bênção
da mesa, a recitação do Rosário, a participação familiar na vida
sacramental, na Eucaristia dominical e nos sacramentos da iniciação
cristã, a vivência do sacramento da reconciliação e a devoção mariana;
ocupar-se das famílias que vivem situações de crise e de "stress";
incentivar a participação da família em movimentos e associações;
valorizar a preparação dos noivos; acompanhar os separados, divorciados e
divorciados recasados, pois sofrem por não poderem se confessar e
comungar, por não compreederem as razões da Igreja para essa proibição;
dar as razões para a não aceitação, por parte da Igreja, de uniões entre
pessoas do mesmo sexo etc.
Como podem perceber, esse Sínodo sobre a
Família tem grandes desafios pela frente. Maior, portanto, é nossa
obrigação de acompanhá-lo com orações, pois, como lembra o Salmista: "Se
o Senhor não construir a casa, é inútil o cansaço dos pedreiros" (Sl
127/126,1).
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