Neste
domingo, 27 de abril, a Igreja passará a invocar a intercessão de São
João Paulo II, o papa das famílias. Durante cerimônia no Vaticano, o
papa Francisco irá canonizar dois papas: João Paulo II e João XVIII.
Em viagem apostólica ao Brasil, em 1997,
o papa João Paulo II participou do 2º Encontro Mundial das Famílias. O
beato celebrou missa de encerramento do evento, para mais de dois
milhões de pessoas, no Aterro do Flamengo, no Rio de Janeiro, em 5 de
outubro. Na ocasião, o papa afirmou que "através da família, toda a
existência humana é orientada para o futuro. Nela, o homem vem ao mundo,
cresce e amadurece. Nela, ele se torna um cidadão sempre mais maduro do
seu país, e um membro da Igreja sempre mais consciente. (...) A
família, enfim, é uma comunidade insubstituível por qualquer outra".
Vale reviver as palavras do santo padre.Abaixo, a íntegra do discurso.
Louvado seja Nosso Senhor Jesus Cristo!
1. "O Senhor nos bendiga em toda a nossa vida" (Sal. Resp.)
Dou graças a Deus por ter permitido
encontrar-me novamente convosco, famílias de todo o mundo, para
reafirmar solenemente que sois a «esperança da humanidade»!
O primeiro Encontro Mundial com as
Famílias teve lugar em Roma, em (mil novecentos e noventa e quatro)
1994. O seguinte se conclui hoje no Rio de Janeiro. Agradeço
cordialmente o convite do Senhor Cardeal, D. Eugênio de Araújo Sales,
como agradeço a todos os Bispos e às Autoridades brasileiras que
colaboraram para o sucesso deste grande evento. Aqui viemos de vários
países e de várias Igrejas, não só do Brasil e da América Latina, mas de
todos os Continentes para elevarmos, todos juntos, a Deus esta prece:
"O Senhor nos bendiga em toda a nossa vida"!
Com efeito, a família é esta particular
e, ao mesmo tempo, fundamental comunidade de amor e de vida, sobre a
qual se apoiam todas as demais comunidades e sociedades. Por isso,
invocando as bênçãos do Altíssimo pelas famílias, rezamos juntos por
todas aquelas grandes sociedades, que aqui representamos. Rezamos pelo
futuro das nações e dos Estados, como também pelo futuro da Igreja e do
mundo.
De fato, através da família, toda a
existência humana é orientada para o futuro. Nela, o homem vem ao mundo,
cresce e amadurece. Nela, ele se torna um cidadão sempre mais maduro do
seu país, e um membro da Igreja sempre mais consciente. A família é
também o primeiro e fundamental ambiente, onde cada homem distingue e
realiza a própria vocação humana e cristã. A família, enfim, é uma
comunidade insubstituível por qualquer outra. É o que se entrevê nas
leituras da liturgia de hoje.
2. Diante do Messias se apresentam os
representantes da ortodoxia judaica, os fariseus, a perguntar se é
lícito o marido repudiar a mulher. Cristo, por sua vez, pergunta o que é
que Moisés ordenou-lhes; eles respondem que Moisés lhes tinha permitido
escrever uma certidão de divórcio, e despedi-la. Mas Cristo lhes diz:
"Foi por causa da dureza do vosso coração que Moisés vos escreveu este
mandamento. No entanto, desde o começo da criação, Deus os fez homem e
mulher. Por isso, o homem deixará seu pai e sua mãe e os dois serão uma
só carne. Assim, já não são dois, mas uma só carne. Portanto, o que Deus
uniu, o homem não separe!" (Mc 10, 5-9).
Cristo refere-se ao início. Este início
está contido no Livro do Gênesis, onde encontramos a descrição da
criação do homem. Conforme lemos no primeiro capítulo deste Livro, Deus
fez o homem à própria imagem e semelhança, criou o homem e a mulher (cf.
Gn 1,27), e disse: "Frutificai e multiplicai-vos, enchei a terra e
submetei-a" (Gn 1,28). Conforme a segunda descrição da criação, que a
primeira leitura da liturgia de hoje propõe, a mulher foi criada do
homem. Assim refere a Escritura: "Então o Senhor Deus mandou ao homem um
profundo sono; e enquanto ele dormia, tomou-lhe uma costela e fechou
com carne o seu lugar. E da costela que tinha tomado do homem, o Senhor
fez uma mulher, e levou-a para junto do homem. «Eis agora aqui - disse o
homem - o osso de meus ossos e a carne de minha carne; ela se chamará
mulher, porque foi tomada do homem». Por isso o homem deixa seu pai e
sua mãe para se unir à sua mulher; e já não são mais que uma só carne"
(Gn 2,21-24).
3. A linguagem utiliza as categorias
antropológicas do ambiente antigo, mas é de uma extraordinária
profundidade: exprime, de modo realmente espetacular, as verdades
essenciais. Tudo o que foi descoberto posteriormente pela reflexão
humana e pelo conhecimento científico, nada mais fez do que explicitar
aquilo que, ali na raiz, já se achava.
O Livro do Gênesis mostra, antes de mais
nada, a dimensão cósmica da criação. O aparecimento do homem dá-se no
imenso horizonte da criação de todo o cosmo: não é por acaso que isso
tem lugar no último dia da criação do mundo. O homem entra na obra do
Criador, no momento em que se acharam predispostas todas as condições
para ele poder existir. O homem é uma das criaturas visíveis; ao mesmo
tempo, porém, somente dele se afirma na Sagrada Escritura que foi feito
«à imagem e semelhança de Deus». Esta união admirável do corpo e do
espírito constitui uma inovação decisiva, no processo da criação. Com o
ser humano, toda a magnificência da criação visível abre-se à dimensão
do espiritual. A inteligência e a vontade, o conhecimento e o amor –
tudo isto entra no cosmo visível, no momento mesmo da criação do homem.
Entra precisamente manifestando, desde o início, a compenetração da vida
corporal com a espiritual. Assim o homem deixa seu pai e sua mãe, e
une-se à sua mulher, tornando-se uma só carne; mas esta união conjugal
enraiza-se contemporaneamente no conhecimento e no amor, ou seja, na
dimensão espiritual.
O Livro do Gênesis fala disto tudo com
uma linguagem que lhe é própria, que é, ao mesmo tempo, maravilhosamente
simples e completa. O homem e a mulher, chamados a viver no processo da
criação cósmica, se apresentam no limiar da própria vocação, trazendo
em si próprios a capacidade de procriar em colaboração com Deus, que
diretamente cria a alma de cada novo ser humano. Através do conhecimento
recíproco e do amor, e ao mesmo tempo pela união corporal, chamarão à
existência seres semelhantes a eles – e, tal como eles, feitos "à imagem
e semelhança de Deus". Darão a vida aos próprios filhos, como eles
próprios a receberam de seus pais. Esta é a verdade, ao mesmo tempo,
simples e grande sobre a família, como ela surge das páginas do Livro do
Gênesis e do Evangelho: no plano de Deus, o matrimônio - o matrimônio
indissolúvel – é o fundamento de uma família sadia e responsável.
4. Com traços breves mas incisivos,
Cristo descreve no Evangelho o desígnio original de Deus criador. Mas
este relato fá-lo-á também a Carta aos Hebreus, proclamada na Segunda
Leitura: "Deus, origem e fim de todas as coisas, queria conduzir muitos
filhos para a sua glória. Convinha, pois, que tornasse perfeito pelo
sofrimento Aquele que os devia levar à salvação. Na verdade, Jesus que
santifica e os homens que são santificados são todos da mesma
descendência" (Hb 2,10-11). A criação do homem tem o seu fundamento no
eterno Verbo de Deus. Tudo o que Deus chamou a existência, fê-lo pela
ação deste Verbo, o eterno Filho, por meio do qual tudo foi criado.
Também o homem foi criado através do Verbo, e foi criado como homem e
mulher. A aliança conjugal tem sua origem no Verbo eterno de Deus.
N'Ele, foi criada a família. N'Ele, a família é eternamente pensada por
Deus, imaginada e realizada. Por Cristo, ela adquire seu caráter
sacramental, a sua santificação.
O texto da Carta aos Hebreus lembra que a
santificação do matrimônio, como a de qualquer outra realidade humana,
foi realizada por Cristo com o preço da sua paixão e cruz. Ele se
manifesta aqui como o novo Adão. Se é certo que, na ordem da natureza,
todos somos originários de Adão, na ordem da graça e da santificação
todos procedemos de Cristo. A santificação da família tem a sua fonte no
caráter sacramental do matrimônio.
Aquele que santifica – isto é, Cristo – e
todos aqueles que devem ser santificados – vós, pais e mães; vós,
famílias – vos apresentais juntos diante de Deus-Pai com esta súplica
ardente, que Ele abençoe o que realizou em vós mediante o sacramento do
matrimônio. E nesta prece estão todos os casais e todas as famílias que
vivem sobre a face da terra. Deus, o único Criador do universo é, com
efeito, a fonte da vida e da santidade.
5. Pais e famílias do mundo inteiro,
deixai que vo-lo diga: Deus vos chama à santidade! Ele mesmo
escolheu-nos "por Jesus Cristo, antes da criação do mundo - nos diz S.
Paulo - para que sejamos santos na sua presença" (Ef 1, 4). Ele vos ama
loucamente, Ele deseja a vossa felicidade, mas quer que saibais conjugar
sempre a fidelidade com a felicidade, pois não pode haver uma sem a
outra. Não deixeis que a mentalidade hedonista, a ambição e o egoísmo
entrem nos vossos lares. Sede generosos com Deus. Não poderia deixar de
recordar, mais uma vez, que a família está ao «serviço da Igreja e da
sociedade no seu ser e agir, enquanto comunidade íntima de vida e de
amor» (Familiaris consortio, 50). A mútua doação abençoada por Deus,
perpassada de fé, esperança e caridade, permitirá alcançar a perfeição e
a mútua santificação de cada um dos esposos. Servirá, em outras
palavras, como núcleo santificador da própria família, e de expansão da
obra de evangelização de todo o lar cristão.
Queridos irmãos e irmãs, que grande
tarefa tendes por diante! Sede portadores de paz e de alegria no seio do
lar; a graça eleva e aperfeiçoa o amor, e com ele vos concede as
virtudes familiares indispensáveis da humildade, do espírito de serviço e
de sacrifício, do afeto paterno e filial, do respeito e da mútua
compreensão. E, como o bem é por si mesmo difusivo, faço votos também de
que a vossa adesão à pastoral familiar seja, na medida das vossas
possibilidades, um incentivo a irradiar generosamente o dom que está em
vós, primeiramente entre os filhos, depois àqueles casais - talvez
parentes e amigos - que estão afastados de Deus ou passam por momentos
de incompreensão ou de desconfiança. Neste caminho em direção ao Jubileu
do Ano Dois Mil, convido todos os que me ouvem a este revigoramento da
fé e do testemunho de cristãos, a fim de que, com a graça de Deus, haja
uma verdadeira conversão e renovamento pessoal no seio das famílias de
todo o mundo (cf. Tertio Millennio adveniente, 42). Que o espírito da
Sagrada Família de Nazaré reine em todos os lares cristãos!
Famílias do Brasil, da América Latina e do mundo inteiro, o Papa, a Igreja apoiam-se em vós. Tende confiança: Deus está conosco!
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