Estamos
vivendo dois tempos de especial significado para os cristãos: o ano da
misericórdia, proclamado pela papa Francisco, e a Páscoa, celebração da
Ressurreição de Cristo, acontecimento fundante do cristianismo. Estes
dois tempos se entrelaçam dando as pessoas a oportunidade de, no
encontro com o Cristo Ressuscitado e Misericordioso, encontrarem o
caminho para uma reconstrução da própria vida, de retomada de novos
projetos.
A misericórdia divina nos aponta a
reconstrução de nosso ser, de nossos relacionamentos a partir da
experiência do perdão total de Deus nos redimindo de nossas culpas e
dando-nos a oportunidade de vivermos o bem. A Páscoa nos aponta a
esperança do futuro, pois sabemos, na experiência de Jesus, que a morte
não tem a última palavra e não encerra a grande aventura humana, mas que
esta se prolonga após a morte numa vida verdadeira e plena. A vida do
ressuscitado é a consequência de uma vida terrena vivida no amor ao Pai e
aos irmãos e irmãs, e na obediência ao projeto do Pai.
Pensar na Divina Misericórdia, é pensar e
desejar experimentar este amor, esta ternura, este envolvimento de Deus
com as realidades humanas, tomando o ser humano todo e cada ser humano
em sua experiência de fragilidade, compreendendo-o e perdoando-o. E, da
mesma forma, pensar a Páscoa de Jesus, a partir de sua entrega, de seu
suplício, de sua morte como caminho de redenção, é pensar e desejar
contemplar, como Maria Madalena naquela manhã no jardim, o rosto de
Jesus e ouvir sua suave voz nos chamando, como Maria, a ressuscitarmos
com Ele vencendo a tristeza, o desamparo, a desilusão e a angústia que
ainda nos prendem nos "túmulos" de nosso viver.
Jesus é o rosto da misericórdia do Pai,
"Quem me vê, vê o Pai" Ele diz a Filipe. Contemplar o Ressuscitado é
contemplar a Divina Misericórdia. É viver a experiência de nova Páscoa
em nossa vida. A Páscoa foi sempre, em seu sentido maior, uma
experiência profunda da passagem, de mudança, de superação de um crise. A
Páscoa judaica foi a passagem da experiência da escravidão do Egito
para a libertação e vida nova numa terra prometida. A Páscoa cristã foi
através de Jesus (que nos guia como novo Moisés), e é para cada cristão
em qualquer tempo e lugar, a passagem da experiência da escravidão do
pecado e das situações de morte para a libertação de filhos e filhas de
Deus e de uma vida nova em Cristo.
Tudo, na vida de Cristo - sua
encarnação, seu ministério, sua paixão, morte, e sobretudo sua
Ressurreição - foi um único movimento de resgate das pessoas de uma
situação de "não-existir" verdadeiramente, para introduzi-las em um
"novo existir" a partir de seu relacionamento com o Pai Eterno, com o
próximo seu irmão-irmã, e com o próprio Cosmos.
Aproveitemos este duplo "kairós" (tempo
especial) para contemplarmos o Rosto da Divina Misericórdia em Jesus
Ressuscitado e nos tornarmos, para nossos irmãos e irmãs, sempre
iniciando em nossa família, o rosto misericordioso que também eles
precisam contemplar.
Pe. Moacir Silva Arantes
Assessor Nacional da Comissão Episcopal Pastoral para a Vida e Família da CNBB e
Secretário Executivo da Comissão Nacional da Pastoral Familiar - CNPF
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